Cidades interligadas de 2,5 mil anos são descobertas na Amazônia
Arqueólogos detectaram a existência de estruturas de engenharia avançada que comprovam que a floresta não é intocada
Arqueólogos dentro da floresta amazônica descobriram uma extensa rede de cidades que remonta a 2.500 anos atrás.
Os assentamentos pré-hispânicos altamente estruturados, com ruas largas e estradas longas e retas, praças e aglomerados de plataformas monumentais foram encontrados no Vale Upano, no Equador Amazônico, no sopé oriental dos Andes.
A descoberta foi publicado em um estudo na revista Science na última quinta-feira (11).
A descoberta da maior e mais antiga rede urbana de características construídas e escavadas na Amazônia até agora foi o resultado de mais de duas décadas de investigações na região por uma equipe de estudiosos da França, Alemanha, Equador e Porto Rico.
A pesquisa começou com trabalho de campo antes de implantar um método de sensoriamento remoto chamado “detecção e alcance de luz”, ou Lidar, que usava laser para encontrar estruturas abaixo das copas espessas das árvores.
O principal autor do estudo, Stéphen Rostain, arqueólogo e diretor de pesquisa do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS) da França, descreveu a descoberta como “incrível”.
‘Engenharia avançada’
“O Lidar nos deu uma visão geral da região e pudemos perceber o tamanho dos locais”, disse ele à CNN nesta sexta-feira (12), acrescentando que o equipamento mostrou uma “teia completa” de estradas escavadas. “O Lidar foi a cereja do bolo”.
Rostain disse que as primeiras pessoas que viveram lá, há 3.000 anos, tinham casas pequenas e dispersas.
No entanto, entre aproximadamente 500 a.C. e 300 a 600 d.C., as culturas Kilamope, e mais tarde Upano, começaram a construir montes e a colocar as suas casas em plataformas de terra, de acordo com os autores do estudo.
Essas plataformas foram organizadas em torno de uma praça baixa e quadrada.
Os dados do Lidar revelaram mais de 6.000 plataformas na metade sul da área pesquisada de 600 quilômetros quadrados.
As plataformas eram, em sua maioria, retangulares, embora algumas fossem circulares, e mediam cerca de 20 metros por 10 metros, segundo o estudo.
Elas, normalmente, eram construídas em torno de uma praça e em grupos de três ou seis. As praças também costumavam ter uma plataforma central.
A equipe também descobriu complexos monumentais com plataformas muito maiores, que, segundo eles, provavelmente tinham função cívica ou cerimonial.
Foram descobertos pelo menos 15 aglomerados de complexos identificados como assentamentos.
Alguns assentamentos eram protegidos por valas, embora houvesse obstruções nas estradas perto de alguns dos grandes complexos.
Isso sugere que os assentamentos foram expostos a ameaças, sejam externas ou resultantes de tensões entre grupos, disseram os pesquisadores.
Mesmo os complexos mais isolados estavam ligados por caminhos e por uma extensa rede de estradas maiores e retas, com meios-fios.
Nas zonas vazias entre os complexos, a equipe encontrou características de cultivo de terras, como campos de drenagem e terraços. Estas estavam ligadas a uma rede de caminhos exclusivos para pedestres, segundo o estudo.
“Por esse motivo, chamo isso de cidades-jardins”, disse Rostain. “É uma revolução completa em nosso paradigma sobre a Amazônia”.
“Temos que pensar que todos os indígenas da floresta tropical não eram tribos seminômades perdidas na floresta em busca de alimento. São uma grande variedade, diversidade de casos e alguns também tiveram um sistema urbanístico, com uma sociedade estratificada”, disse.
A organização geral das cidades sugere “a existência de engenharia avançada” na época, de acordo com os autores do estudo, que concluíram que o urbanismo de jardins do Vale do Upano “fornece mais uma prova de que a Amazônia não é uma floresta intocada como já foi retratada”.
Rostain disse que as pessoas devem imaginar a Amazônia pré-colombiana “como um ninho de formigas”, com todos ocupados com atividades.
Lugares semelhantes encontrados nas Américas
Esta rede urbana recentemente descoberta alinha-se estreitamente com outros locais que foram encontrados nas florestas tropicais do Panamá, Guatemala, Belize, Brasil e México, de acordo com o arqueólogo paisagista Carlos Morales-Aguilar, pós-doutorado na Universidade do Texas, em Austin, que não esteve envolvido no estudo.
Ele chamou o estudo de “inovador”, dizendo à CNN que não apenas “fornece evidências concretas do planejamento urbano avançado e inicial na Amazônia, mas também contribui significativamente para a nossa compreensão do legado cultural e ambiental das sociedades indígenas nesta região”.
Em 2022, Morales-Aguilar fez parte de uma equipe de pesquisadores que usou o Lidar para descobrir um vasto sítio no norte da Guatemala, com centenas de antigas cidades, vilas maias interconectadas, bem como uma área de 177 quilômetros de extensão de trilhas de pedra elevadas que conectavam comunidades.
Ele disse que as descobertas deste último estudo refletem as técnicas avançadas de agricultura e planejamento urbano que ele observou no norte da Guatemala e “oferecem novos insights sobre as complexidades dessas sociedades primitivas”.