The World’s 50 Best Bars: o que é o ranking que mexe com a cabeça dos bartenders e aquece público
Relação com os melhores bares do mundo é considerada uma espécie de Oscar da bebericagem
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Drink do bar Tan Tan, em São Paulo, único brasileiro no ranking do 50 Best Bar • Divulgação
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Guilhotina Bar, em São Paulo • Divulgação
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Premiação do 50 Best Bar que elegeu o bar Paradiso, localizado Barcelona, na Espanha, o melhor bar do mundo. • Divulgação
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Mark Sansom, diretor de conteúdo da The Wold 50 Best Bars • Divulgação
Era uma terça-feira de outubro de 2022 quando, perto das 20h do horário local, as estrelas da noite começavam a chegar à imponente Cúpula de Las Arenas, em Barcelona. Vindas de todas as partes do mundo, com trajes de gala, passavam pelo tapete vermelho sob flashes de fotógrafos, lentes de cinegrafistas e olhares atentos de curiosos. Mas, ao contrário do que a ocasião cheia de pompa fazia parecer, não se tratava de nenhuma premiação do cinema ou da música. Com mais de mil convidados, a cerimônia que agitava a cidade espanhola era na verdade a divulgação oficial do ranking da The World’s 50 Best Bar.
Editada pela primeira vez em 2009, a lista é atualmente a mais aguardada publicação que se propõe a eleger os melhores bares do mundo, ofuscando até premiações tradicionalíssimas do setor, como a Tales of The Cocktail, que ocorre todos os anos na cidade americana de New Orleans.
“De todas, a 50 Best é a que mais aposta em diversidade”, defende Thiago Bañares, chef e sócio do Tan Tan, bar de pegada asiática em Pinheiros, e do The Liquor Store, o intimista bar focado apenas em alta coquetelaria nos Jardins. “Ela coloca no mapa lugares nos quais você tem uma boa experiência como um todo, e não apenas uma avaliação do aspecto técnico.”
Seu endereço foi o único brasileiro a figurar na lista do ano passado, na 62ª posição. Isso porque, apesar de ela contemplar oficialmente os cinquenta melhores endereços pelo mundo – como o nome sugere -, há uma listagem complementar que enumera os mais bem classificados do 51º ao 100º lugar.
“Tudo se resume às opiniões pessoais e às experiências que os jurados vivenciaram”, explica Mark Sansom, que há cinco anos é diretor de conteúdo da The World 50 Best Bars. “Todos os bares do mundo são elegíveis, desde que estejam abertos na época do anúncio da lista ou não estejam prestes a fechar.”
Sansom ainda conta que o ranking é feito a partir da avaliação de aproximadamente 650 profissionais, entre bartenders, consultores, jornalistas e outros nomes do setor em todo o mundo. Cada um deles deve apontar sete bares, por ordem de preferência, com base em suas melhores experiências dos últimos 18 meses. E desde 2017 seus nomes são confidenciais para evitar qualquer tipo de vantagem ou assédio. “Pelo menos 25% dos eleitores são trocados a cada ano, proporcionando novas perspectivas”, completa.
É a mesma dinâmica da The World’s 50 Best Restaurants, que foi criada em 2002 como o primeiro review global da William Reed, grupo de mídia baseado no Reino Unido. Em 2013, vieram as duas primeiras listas regionais, da Ásia e da América Latina, e, em 2017, a empresa adquiriu The World’s 50 Best Bars, que era publicada desde 2009, assim como a Asia’s 50 Best Bars, que já existia desde 2016. Em 2019, foi lançado ainda 50 Best Discovery e, em 2020, concebido o 50 Best for Recovery, arrecadando 1,29 milhões de dólares para dar apoio à indústria de hospitalidade. Para 2023, está ainda programado o lançamento da 50 Best Hotels, voltado ao setor de hotelaria.
Mas, como acontece em todo ranking e premiação, as listas da The 50 Best não são unanimidade. Em 2015, um grupo de chefs e empresários do setor, de diferentes partes do mundo, protestou contra a legitimidade do prêmio voltado aos restaurantes.
Eles chegaram a criar, inclusive, o movimento Occupy 50 Best, pedindo mais transparência na votação. Entre os signatários desse manifesto, estavam figuras do calibre de Jöel Rebuchon, chef francês morto em 2018 e um dos maiores detentores de estrelas do reputado guia Michelin, e Rogério Fasano, restaurateur brasileiro por trás do sucesso do grupo Fasano.
Na cena de bares, no entanto, é mais difícil encontrar vozes contrárias à publicação. E, apesar de todo o prestígio por aqui, o Brasil ainda figura pouco nela. Nossas casas só passaram a aparecer em 2017, com Frank Bar, Guilhotina e SubAstor ficando entre a 66ª e a 90ª posição. No ano seguinte os três repetiram o feito e, em 2019, o Guilhotina foi o único brasileiro até hoje a entrar no top 50, sendo eleito o 15º melhor do mundo.
Desde então, somente o Tan Tan representa o país. “Não estamos atrás de nenhum outro lugar do mundo em termos de técnica e produto”, garante Márcio Silva, bartender responsável por botar o Guilhotina no mapa e que atualmente, já fora da casa, se põe a viajar o mundo para dar workshops, masterclasses e participar de guests. “O problema é que ainda falta união dos profissionais da área para trazer ao país mais bartenders, jornalistas e outras pessoas importantes do setor.”
Hoje, Silva aparece em outra lista: a das 100 pessoas mais influentes do mundo na indústria de bares, esta publicada pela revista inglesa “Drinks International”. Ele aprendeu o ofício de bartender na Europa, para onde partiu ainda nos anos 90. Trabalhou com grandes nomes da coquetelaria mundial e, em 2009, voltou para se dedicar à abertura do SubAstor, na Vila Madalena. No meio do caminho inaugurou o Guilhotina e atualmente se apresenta como “parceiro de novos negócios” do grupo responsável pelo Locale Caffè, no Itaim Bibi, com quem vem desenvolvendo projetos.
Ele lembra que, antes mesmo de inaugurar o Guilhotina, em janeiro de 2017, começou uma campanha a fim de tornar o endereço conhecido mundo afora. “Criei uma hashtag e mobilizei gente de todo canto nas redes sociais para divulgá-la.” Os frutos, diz, vieram rápido. “Abrimos já conhecidos, e com quatro meses o bar recebeu indicações em premiações internacionais.” Somam-se a isso dezenas de viagens, nas quais Silva diz ter levado o nome do Guilhotina para o mundo.
“Muita gente fala em lobby, mas é preciso ter um trabalho consistente.”
Bañares, que assim como Silva também aparece na relação da revista inglesa “Drinks International”, endossa. “A gente tem que fazer campanha para mostrar ao máximo de pessoas o nosso trabalho”, diz ele, que guarda no currículo passagens por casas como D.O.M. e Arturito e hoje comanda um grupo do qual faz parte ainda o restaurante Kotori.
O especialista do Tan Tan garante, no entanto, que nunca passou pela cabeça fazer parte de uma lista como a do 50 Best Bars. “Quando abri a casa, em 2015, a ideia era ser um restaurante de lámen.” Foi só em 2018 que assumiu a atual vocação, investindo pesado na coquetelaria em conjunto com o bartender Alex Mesquita. “Hoje a gente entende que existe um lado político da lista. É preciso visitar outros lugares, conhecer as pessoas e ser conhecido por elas.”
Fabio la Pietra, italiano que desembarcou por aqui em 2013 para comandar o bar do Subastor, comenta que a indústria de bebidas desempenha um papel importante nesse “intercâmbio cultural”. Afinal, de acordo com levantamento mais recente da International Wine and Spirits Research (IWSR), o mercado global de bebidas alcoólicas tem hoje um valor estimado em US$ 1,17 trilhão, aproximadamente R$ 5,8 trilhões.
“As marcas precisam de ideias, e nós de orçamento. Assim, elas investem na questão educacional, patrocinando seminários e guests”, diz Bañares, que complementa: “A indústria de bebidas tem muitos recursos, te ajuda a movimentar a cena, trazer profissionais de fora.”
Para eles, fazer parte de uma lista como a da The 50 Best Bars não faz bem apenas para o ego. Trata-se de algo que impacta o negócio como um todo.
“O SubAstor começou a receber mais convites para levar nosso trabalho para fora, acabamos trocando aprendizado com o mundo todo. E toda a equipe ganha uma motivação”, diz La Pietra.
Para Bañares, o reflexo no movimento foi evidente. “Passamos a ter, em dias como terça e quarta-feira, o mesmo movimento que tínhamos no fim de semana.”
Marcello Nazareth, que se mantém à frente do Guilhotina, diz que as boas posições em rankings passados reverberam até hoje. “Muita gente que vem de fora busca nos conhecer. É uma chancela.”
Ainda que todo o trabalho de network para aparecer internacionalmente tenha sido prejudicado pela pandemia, Naza, como é conhecido, se mostra otimista. Por lá já passaram Spencer Amereno Jr., que afirma que o “50 Best é o sonho de quem é da área”, foi ele que conduziu o Frank à publicação entre 2017 e 2019 e que há dois anos fechou as portas. Recentemente quem assumiu o bar do Guilhotina é o Alê D’Agostino.
Este ano o anúncio dos laureados está programado para o dia 17 de outubro, em Singapura. “Em 2022, pegamos a estrada, deixando Londres pela primeira vez. E, após o sucesso da premiação em Barcelona, sabíamos que tínhamos que ‘espalhar o amor’ por outras partes do mundo”, declara Sansom. “Quem sabe o Brasil não sedia o evento nos próximos anos?”.