Dino vota para condenar Bolsonaro por plano de golpe; placar: 2x0

Eventual condenação de Bolsonaro pela Primeira Turma do STF depende de maioria de três votos; Fux é o próximo a votar

Davi Vittorazzi e Gabriela Boechat, da CNN, Brasília
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O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), acompanhou Alexandre de Moraes e votou para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete réus por tentativa de golpe de Estado.

Com isso, o placar para a condenação está em 2x0. Se Luiz Fux, próximo ministro a votar, também entender pela condenação, o STF já terá maioria para responsabilizar Bolsonaro e os outros réus.

Até então, ambos os ministros votaram para condenar o ex-presidente pelos cinco crimes dos quais foi acusado: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

No caso de Ramagem, Dino considerou a suspensão para a ação penal aprovada pela Câmara dos Deputados, referendada, em parte, pela Primeira Turma do STF, que julga o caso. Ainda assim, houve voto para condená-lo por abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa armada

Para o ministro, Bolsonaro e o ex-ministro Walter Braga Netto tinham controle e liderança sobre as ações da organização criminosa e, por isso, devem responder a penas maiores.

Já os ex-ministros Paulo Sérgio Nogueira, Augusto Heleno e o deputado e ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Alexandre Ramagem teriam tido uma participação de “menor importância” e deverão pegar penas menores.

Conforme adiantou a CNN, a dosimetria (ou seja, os valores das penas) serão definidos ao final dos votos, caso haja condenação.

Julgamento político

Dino começou o voto afirmando que o julgamento do plano de golpe é um caso como outro qualquer, baseado nas mesmas leis e no devido processo legal.

O ministro rejeitou tentativas de politizar o julgamento e a Suprema Corte. Disse que o STF já julgou pessoas de todos os espectros políticos e que sempre se baseou nas provas e autos de cada caso, atuando de forma técnica.

Anistia

Dino disse também que crimes contra o Estado Democrático de Direito não são “anistiáveis” e mencionou votos de ministros, proferidos em outras ocasiões, que provam o seu ponto.

Um dos votos mencionados foi o de Luiz Fux, que tem sinalizado divergências em relação à posição dominante de condenar os réus da trama golpista com penas mais severas.

A fala vem em meio às articulações da oposição para conceder uma anistia "ampla, geral e irrestrita" a Bolsonaro ou uma anistia "light" que envolva apenas os condenados do 8 de janeiro.

Consunção

Dino afirmou também que, no caso analisado, não há separação entre “crime meio e crime fim”, sinalizando ser contrário à uma redução da pena com base no princípio da “consunção”.

Durante a fase de instrução penal, defesas tentaram emplacar esse princípio para aliviar as penas de seus clientes. Eles argumentam que o crime de "abolição violenta do Estado Democrático de Direito"  é um meio para o crime de “golpe de Estado” e, portanto, os réus não poderiam ser punidos duas vezes.

Atos executórios

O ministro também defendeu que o plano de golpe não se resume somente a “atos de preparação” que não foram para a frente, como alegam algumas defesas.

Dino afirma que houve atos executórios, ou seja, os réus teriam agido efetivamente e iniciado um golpe de Estado.

“Isso está mostrado nos autos. Os atos preparatórios já expõem ao perigo o Estado Democrático de Direito”, afirmou.

Grave ameaça

Dino também rebateu, com ironia, argumentos de advogados sobre não ter havido violência ou grave ameaça por parte dos réus.

“A grave ameaça e a violência estiveram presente nos atos executórios. Houve invasão violenta dos Três Poderes. Eu não conheço nenhum caso, na literatura, em que manifestantes chegaram para policiais e disseram: ‘Por favor, eu vou romper esse cerco policial e trouxe flores, chocolates e bombons […] O nome do plano não era Bíblia Verde e Amarela, era Punhal Verde e Amarelo”, disse.

Delação de Mauro Cid

Acompanhando Moraes, Dino votou pela manutenção da delação do tenente-coronel Mauro Cid. Dino disse ter lido todos os depoimentos pessoalmente e constatado que não houve “diversas delações diferentes”, mas depoimentos que se complementavam e tratavam de assuntos distintos.

Mais cedo, Moraes afirmou que aqueles que questionam o número de depoimentos de Cid, dizendo que são todos contraditórios, beira à litigância de má-fé.

Luiz Fux foi um dos que disseram ver com “reserva” o número de depoimentos de Cid. O ministro afirmou em abril que analisaria a questão em momento oportuno, no julgamento.

Recados

Em vorto, Dino fez uma ofensiva ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, quando disse que "agressões e ameaças de governos estrangeiros" não teriam o potencial de interferir no julgamento.

Fez também uma referência à aplicação da Lei Magnistsky ao ministro Alexandre de Moraes. "Imagina que cartão de crédito ou Disney vão mudar o curso do julgamento", ironizou.

O ministro rechaçou ainda as alegações de que o Supremo é um tribunal tirânico ou que seus ministros atuam como ditadores. No domingo, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, subiu em um palanque e - no vácuo de Bolsonaro, que está em prisão domiciliar - radicalizou o discurso, referindo-se ao STF como uma "ditadura da toga".

"Quem chega ao Supremo, chega com sua trajetória, com seu patrimônio de experiências e com o peso da institucionalidade. Ninguém está aqui para fazer nódoa a essa tradição", disse Dino, sem mencionar o governador.